"A igreja dizia que era minha cruz. Eu carreguei até quase morrer."
Tatiane, 38 anos
Eu sou evangélica desde que nasci. Cresci ouvindo que a mulher virtuosa era aquela que suportava. Que casamento era sagrado. Que homem é cabeça e mulher é corpo.
Casei com 20 anos com um homem da igreja, escolhido a dedo pela liderança. O Cláudio era calado, rígido, parecia sério. A primeira vez que ele gritou comigo foi porque eu usei calça jeans num culto. Me mandou ajoelhar e pedir perdão a Deus.
Depois vieram os tapas. No começo, escondidos. Um empurrão aqui, um puxão de cabelo ali. Se eu chorava, ele dizia: “Mulher de fé não se abala com correção.”
Ele dizia que era meu papel ser submissa. E eu tentava, de todo jeito. Jejuava, orava, lia Provérbios 31 todo dia. Fui ficando cada vez menor dentro de mim.
Quando contei pra pastora, ela me mandou orar mais. Quando contei pra minha mãe, ela disse: “Ele te dá comida, casa, não te larga. Já é mais do que muita tem.”
A gota d’água foi quando ele levantou a mão na frente dos meus filhos. O mais velho, de 9 anos, se colocou na frente pra me proteger. E levou um tapa no rosto.
Eu vi o olhar do meu filho. Não de medo. De vergonha. E aquilo me rasgou.
Fugi no meio da madrugada. Peguei um Uber com o dinheiro que escondi por dois meses. Fui pra um abrigo que me indicaram pelo WhatsApp de uma irmã que já tinha passado por isso.
Hoje moro com meus filhos num apartamento emprestado. Ainda oro. Mas pra um Deus que não quer me ver sofrendo.
E quando lembro da igreja me dizendo pra aguentar, eu digo: “Deus me deu força, não corrente.”